"O país está ficando mais velho, o topo demográfico está engordando. A gente está preparando jovens com esse patamar muito baixo de aprendizado. Nem conseguimos dar conta do século 20 e está vindo aí um novo ciclo de trabalho, do século 21, com exigências de competências altas e dinamicidade do conhecimento” (Mozart Neves Ramos – diretor do Instituto Ayrton Senna)De algum tempo para cá temos lido e ouvido uma expressão popular, intensamente usada por analistas sociais, psicólogos, comportamentalistas, pedagogos e sociólogos, apontando os nem-nem, os que nem trabalham nem estudam (situação agravada pelos que não procuram emprego, não têm família, não têm projeto de vida...). A eles, têm se somado os sem-sem, jovens (às vezes nem tanto) que utilizam celular e redes sociais sem limites, e, não raro, sem noção das consequências. Para eles, as redes sociais são tudo na vida, por isso as acessam diuturnamente. Abusam do Instagram e do Facebook, do YouTube e muito mais do WhatsApp. Afinal, eles são o que são ou são o que querem parecer ser? O Orkut já virou pó, mostrando quão efêmeras são essas mídias. Muitos deles tanto não trabalham como não estudam e, sem condições ou sem atributos que, parece, não lhes fazem falta, não têm projeto de vida, não se importam com o futuro e sequer carteira de trabalho têm. Os sem-sem, mas sobretudo os nem-nem, são uma verdadeira bomba-relógio, porque a todos os fatores negativos agora elencados, geralmente se somam más companhias, uso de drogas, convite ao crime organizado, famílias desestruturadas. Para explodir, basta uma fagulha no estopim. Se a esse caldeirão adicionarmos os des-des – desmotivados e despreparados – nossa tragédia fica completa. Quem os descreve é a jornalista Nina Finco na excelente matéria de capa da revista Época de maio deste ano, A bolha dos ultrajovens (ou geração Y[1]). Ela traz como referência um estudo do Box1824, conduzido pelos pesquisadores Sean Monahan e Sophie Secaf, nos Estados Unidos: “Eles se tornam personagens de suas próprias vidas, preocupados com narrativas, contextos, motivações. Estão sempre esperando pelo terceiro ato – que nunca chega”. São os GenExit, a geração que opta por experimentar novas possibilidades identitárias, mais livres e menos deterministas, e não menos disruptivas. Trata-se de jovens tão aficionados por smartphones que deixariam de comparecer a qualquer compromisso se não pudessem portá-los por ser vedado no ambiente. Padecem da nomophobia (do termo em inglês no mobile-phone phobia): a fobia de ficar sem o celular. O desespero bate quando perdem o aparelho, quando a bateria acaba ou quando ficam sem cobertura de rede. Ou seja, trata-se, como qualquer outro vício, de um comportamento compulsivo. Lamentável mesmo é que esses jovens são portadores de expectativas educacionais e profissionais cada vez mais irreais para si mesmos. O que assusta, além do “desencanto” dessa juventude, é saber que integram a “era da distração” e daqueles com “déficit de atenção”. Ambos os fenômenos reduzem cada vez mais a capacidade de concentração, tudo indicando como resultado a falta de tempo ocioso. Esses nativos digitais nunca se enfadam porque estão sob constante estímulo, nem sempre positiva e produtivamente. No Brasil a Unicef traz dados estarrecedores: temos 32 milhões de crianças e jovens pobres. Isso mesmo, para a Unicef, 6 em cada 10 jovens de até 18 anos são pobres, não têm renda suficiente para uma cesta básica e/ou sofrem uma das privações: educação, informação, lazer, acesso a água, saneamento ou moradia. Calamitoso. É um contingente enorme que provavelmente estará fora do mercado formal por muito tempo e comprometerá a produtividade da mão de obra brasileira em médio prazo. A informação que segue é de Gilberto Alvarez, Diretor executivo do Cursinho da Poli:
“De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2017, o país tinha 11,16 milhões de pessoas de 15 a 29 anos (20%) que não estudavam nem trabalhavam, 619 mil a mais do que em 2016. Esse contingente representava 23% da população dessa faixa etária em 2017. Essa proporção era menor no ano anterior, de 21,8%. Jovens que não encontram espaço no mercado de trabalho, não demonstram interesse em procurar emprego e também não querem saber de continuar a estudar. Um dado alarmante, que revela o tamanho da bomba-relógio que ameaça o futuro do Brasil.”Ou seja, é um cenário desolador para quem não consegue achar uma saída à sua condição econômica, que gera risco e vulnerabilidade social. Para essa geração de excluídos, a escola, tal como se apresenta hoje, não oferece atrativos. Mas, se ela lhes faltar, esses jovens só terão acesso a trabalhos precários. Esse grupo sem trabalho e sem escolaridade mora com os pais (família, às vezes, completamente desestruturada) e acaba tendo como referência alguém que não deu continuidade aos estudos nem percebe a importância do saber para si e para a comunidade. A verdade real é que estamos atravessando um período tormentoso no qual todos dão opinião e palpites, mas ninguém dá a solução. Daí ficamos a tergiversar, arriscando saídas olímpicas quando para esses jovens o país é um mundo em desencanto, onde reina a desesperança, mais motivada por um sem-número de fatores negativos, a começar pela falta de escola desejável e de qualidade, pelo noticiário pessimista, pela corja instalada na política, pela violência, pelas importunidades, e por aí vai. É preciso despertar no jovem o desejo de aprender, participar da sociedade e exercer seu papel de cidadão, sobretudo para fazer a democracia avançar e reduzir a desigualdade social. Os milhões de jovens “nem- nem” de hoje, ou os “sem-sem” serão certamente os profissionais desmotivados e despreparados – “des-des” – de amanhã. A escola ainda é – e está aí o exemplo de países que “viraram a mesa” até de sua economia por meio dela – um dos atores sociais imprescindíveis para empoderar seus jovens. Mas ela precisa não só estar antenada às mudanças que o novo milênio impõe a todos nós. Há desafios de ordem estrutural, há desafios de condições sócio- econômicas da procedência dos jovens e também as mudanças pedagógicas que atingem a própria escola. Quer maior razão e justificativa que as escolas de ontem e de hoje não deram ou não dão certo é só olhar em volta. É só ter olhos de ver e não de enxergar.
[1] As gerações a) Geração do silêncio – nascidos entre 1928-1945 b) Baby boomers – nascidos entre 1946-1964 c) Geração X – nascidos entre 1965-1980 d) Millennials – Geração Y – nascidos entre 1981-1997 e) Pós-millennials – nascidos entre 1998-2018 4